O
dia que fiquei invisível
Este texto da Sra. Silvia Castillejon Peral, me fez imaginar
envelhecimento. Estou na terceira idade, ainda bem saudável e trabalhando. Mas parando
um momento para meditar , o texto é bem realístico. Criamos filhos para o
mundo, os preparamos para seguir em frente, formar família, fazer carreira e
viver a vida. Caberemos nestas vidas? So o tempo responderá. Teremos saúde para
ficarmos só? Só o tempo respondera. A
partida sera tranquila? Esta resposta ficara para o ultimo dia. Ate la vou
vivendo, trabalhando ,amando, convivendo .
Mas este texto realmente nos convida a
repensar a vida.
“Perdi a noção do tempo. No meu
quartinho não há mais folhinhas, na memória tudo está em reboliço. Coisas
antigas foram desaparecendo como por encanto. Também fui apagando sem que
ninguém se apercebesse. Morava com minha filha casada, porque sou viúva. Quando
a família cresceu, me trocaram de quarto, para dar espaço ao novo membro que
acabara de nascer. Passaram-me para a edícula, no fundo do terreno, com as
tralhas da casa. Para serem “gentis” prometeram trocar o vidro quebrado da
janela. Mas se esqueceram. Nas noites frias, o vento gelado aumenta minhas
dores reumáticas.
Um dia minha voz desapareceu, os filhos
e netos não me respondiam. Fiquei sem voz, pensei. Por sua vez, eles
conversavam sem olhar para mim, como se eu não existisse. Tento lhes dizer
algo, na esperança que apreciem meus conselhos, mas sou ignorada. Não respondem
e nem sequer me olham. Nestas condições, me retiro de fininho e vou para meu
canto antes de terminar a caneca de café. Fiz isto várias vezes, para
compreenderem que estou magoada e então pedirem perdão... Mas ninguém
vem. Depois de mais uma noite de insônia e mágoa tento lhes dizer: - Quando
morrer, ai sim vão sentir minha falta. Neste momento meu neto em
deboche diz: - Estás viva ainda vó?
Numa certa manhã, um dos meninos entrou
no meu quartinho, jogou umas rodas de bicicletas, sem notar minha presença com
ao menos um oi vó. Mas nada disso aconteceu. Então me convenci, fiquei
invisível.
Houve um dia quando os meninos me
disseram que no dia seguinte iríamos todos ao campo, neste raro momento me
tornei visível novamente. Apalpei meus braços e me reconheci, fiquei feliz.
Sorria como criança de contentamento. Fazia tanto tempo que não saia!
Fui a primeira se levantar. Arrumei-me
logo para não correr o risco de atrasá-los. Em pouco tempo, todos entravam e
saiam da casa, jogando bolsas e brinquedos no carro. Eu já estava pronta,
feliz. Esperei aguardando me chamarem. Mas nada disso aconteceu. Devo ter
ficado invisível novamente – pensei. Procurei me justificar, a família cresceu
e não sobrou lugar para mim.
Neste momento, caí na real e tive
vontade de chorar. Mas pensei, são jovens, riem, sonham, se abraçam, se beijam.
E eu... bem, antes beijava os meninos e as meninas, me agradava tê-los nos
braços, era um pedaço de mim continuando a vida. Ah, até cantava canções de
ninar para que fossem absorvidos pelo sono.
Um dia minha neta acabava de ter um
bebê, minha bisneta! Que alegria. Sem cerimônia me disse que não era bom
que os velhos beijassem os bebês por questões de higiene. Poderia
contaminá-los. Desde então, não me aproximei de tanto medo de contagiá-los! Mas
eu os bendigo e a todos perdoo, porque... que culpa eles têm de eu ter-me
tornado invisível? “
Depois desta história, me convenci de
que existem milhões de seres ocultos, zumbis invisíveis nos asilos e hospitais
porque se tornaram irrelevantes, ou um estorvo, ou um nada para a sociedade e
para o progresso. Tornaram-se socialmente invisíveis. Queira Deus que muitos
cheguem pelo menos a ser invisíveis, porque outros nem lá chegam, atropelados
pela indiferença e pela ausência de amor.”
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